Autor: Pr. James E. McGoldrick
A
fé protestante se originou em um tempo de escândalo quando Johann Tetzel, um
monge dominicano apareceu na Alemanha e foi por todos os lugares vendendo
certificados de indulgências. Era outono de 1517 quando o escândalo começou.
Tetzel prometeu aos seus ouvintes que eles poderiam obter a remissão dos
pecados das pessoas queridas que já haviam morrido e ido para o purgatório.
Consequentemente, pessoas piedosas juntaram seus bens e correram para Tetzel
para comprar estes documentos, pois isto parecia ser o requisito de caridade
cristã - para que os entes queridos fossem libertos dos tormentos do purgatório
e tivessem a entrada no céu assegurada. De fato, Tetzel levou pessoas a crerem
que podiam obter o perdão meramente ao colocarem suas moedas no seu cofre-caixa
e levando em troca os certificados oferecidos por ele. Para tornas sua campanha
mais popular, Tetzel recitava o seguinte jingle: “Assim que a moeda no cofre
tilintar, a alma do purgatório irá saltar”. As pessoas pareciam vir de todos os
lugares, procurando libertar seus queridos das chamas da punição. O purgatório,
no ensino da igreja medieval, era retratado como um lugar de punição temporal
pelos pecados; O tempo que a pessoa deveria passar lá seria determinado pelo
número e gravidade das ofensas. Quando uma pessoa havia sido completamente
purgada, ela estaria liberada para ir para o céu.
Informações
a respeito das atividades de Tetzel logo chegaram à Universidade de Winttemberg
onde o Doutor Martin Luther (Martinho Lutero) Professor de Teologia, as recebeu
com consternação. Ao invés de reagir com uma esperança feliz que caracterizava
a reação das pessoas que estavam comprando os documentos de Tetzel, Lutero
ficou enfurecido. Ele falou vigorosamente contra estas atividades e denunciava
todo negócio como um escândalo de imensas proporções e defendia que a igreja
tinha que ser salva deste terrível tráfico de indulgências. Lutero foi para
frente da porta da igreja do castelo de Wittemberg, com um documento em uma
mão, um martelo na outra e afixou na porta uma lista com noventa e cinco
protestos contra a venda das indulgências. Ele também disse ao povo que estava
sobre os seus cuidados que eles haviam sido cruelmente enganados. Os
certificados de indulgências não prometiam a remissão de pecados e não podia
garantir a salvação deles ou dos seus parentes mortos. O povo humilde alemão e
a população comum das cidades não sabiam ler latim e os certificados estavam
impressos em latim. Tetzel havia apostado na ignorância do povo quando os
incentivava a acreditar que haviam obtido benefícios que não sequer escritos
nos tais documentos.
De
acordo com os ensinamentos da igreja católica, a igreja tem a custódia dos
Tesouros dos Méritos que são adquiridos pelos grandes santos que haviam
excedido as boas obras necessárias para sua salvação. Este excesso de méritos
se tornava uma fonte da qual a igreja poderiam distribuir méritos aos que
estavam deficientes, e a indulgência se tornou o meio pelo qual os pecadores
necessitados poderiam obter méritos desta tesouraria. Nos anos entre 1460-1470,
o Papa Sixtus IV declarou que os benefícios obtidos através das indulgências
poderiam ser transferidos para os crentes que há haviam ido para o purgatório.
Lutero,
inflamado de indignação, desafiou a venda de indulgências e exigiu que toda
esta questão fosse discutida pelos estudiosos da Universidade. Ele convidou
alguns colegas acadêmicos para um debate público a respeito das 95 teses ou
objeções, que ele havia escrito sobre a venda de indulgências. Lutero assim
iniciou um protesto que atraiu muitos seguidores, e logo, os que se uniram ao
protesto ficaram conhecidos como os “Protestantes”.
A
palavra “Protestante”, de acordo com a definição do dicionário, é “um membro de
algumas igrejas cristãs que terminaram se separando da igreja católico romana
desde o século XVI: Batistas, Presbiterianos, Metodistas e muitos outros”; ou
“uma pessoa que protesta”.
Foi
no dia 31 de outubro de 1517 quando Martinho Lutero afixou os seus protestos na
porta da igreja do castelo. Ele protestava contra os abusos e as corrupções
ligadas a venda de indulgências e denunciava o ensino de que o perdão dos
pecados poderia ser obtido através de “contrição, confissão e contribuição”.
Nesta época a igreja ensinava que o perdão dos pecados vinha através do
sacramento da penitência quando o padre, representando Jesus Cristo, absolvia o
pecador que confessava seus pecados, expressava arrependimento e contrição e
dava uma contribuição à igreja, como penitência. Lutero falou com coragem
contra as indulgências e a crença de que o perdão seria realizado através delas
ou de contrição, confirmação e contribuição. A tese de número 32 das 95
escritas por Lutero diz o seguinte: “Aqueles que crêem que podem garantir a
salvação por terem cartas de indulgências serão condenados eternamente
juntamente com seus professores”. Através deste gesto dramático, Lutero começou
uma tentativa de reformar a igreja, de trazê-la de volta às origens bíblicas e
à salvação ensinadas nas Escrituras, para restaurar a pureza da fé do Novo
Testamento. Ele, é claro, não tinha a intenção de se tornar o fundador de uma
igreja separada protestante. De fato, Lutero, naquele ponto, acreditava que o
papa ficaria agradecido por um dos seus monges ter tido a coragem de se
levantar para defender a igreja contra este abuso escandaloso. Lutero não sabia
que esta corrupção já havia permeado a cúpula em Roma. Nem tão pouco que o para
Leão X e Albrecht, o arcebispo de Mainz, haviam organizado a venda de indulgências
e apontado Tetzel como seu representante. Ao contrário de gratidão, Leão X
estava totalmente enfurecido com as ações de Lutero.
O
protesto de Lutero não era de todo negativo, e a palavra “protestante”
realmente não é um termo pejorativo. A palavra é derivada do latim, da
preposição PRO, que significa “para”, e o infinito TESTARE, “testemunho”. Um
protestante, então, é um que testemunha - um protestante é uma testemunha de
Jesus Cristo e da Palavra de Deus. O protestantismo, então, não é meramente o
protesto contra a corrupção eclesiástica e o falso ensinamento; é o
reavivamento, o renascer da fé bíblica, um renascer do cristianismo do Novo
Testamento, com uma ênfase positiva sobre as doutrinas das Escrituras, Graça e
Fé. Dito no belo latim do século XVI, o Protestantismo proclama SOLA SCRIPTURA,
SOLA GRATIA, SOLA FIDE. Estes são os três princípios do protestantismo.
SOLA
SCRIPTURA: Onde a Bíblia afirma ser a Palavra de Deus, o verdadeiro Protestantismo
aceita esta declaração como a verdade. Os protestantes acreditam, como Paulo,
que toda a Escritura é “inspirado por Deus”, que a Bíblia é o guia para a
salvação e que é através da Palavra escrita de Deus que o crente se torna
“perfeitamente habilitado para toda boa obra”.(II Tm.3:17) Os protestantes atribuem
à Bíblia exatamente a mesma autoridade que Jesus Cristo atribuíra à Bíblia da
sua época. Disse Jesus: “Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas: não
vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: Até que o céu e
a terra passem, nem um i ou til jamais passará da lei, até que tudo se cumpra”.(Mt.5:17-18)
Por
ficar ao lado de Jesus nesta questão da autoridade da Bíblia, o Protestantismo
renuncia a autoridade das tradições humana. Quando Jesus debateu com os
fariseus, ele respondeu às suas críticas com a seguinte acusação: “... E assim
invalidastes a Palavra de Deus, por causa da vossa tradição”.(Mt.15:6) Jesus
muitas vezes contradizia as tradições dos homens, mas ele cumpria, mantinha e
defendia a Palavra de Deus. No Sermão do Monte Jesus expôs a confiança dos
judeus na tradição rabínica quando disse: “Ouvistes o que foi dito aos antigos...
Eu, porém, vos digo...”.(Mt.5:21-22) Desta maneira Jesus contradizia os
ensinamentos tradicionais dos rabinos que haviam pervertido a Palavra de Deus
através de falsas interpretações. Jesus disse, em outras palavras: “Esqueçam o
que os rabinos lhes ensinaram e ouçam o que eu digo, pois a minha palavra é a
Palavra de Deus”. Quando comparada ao Velho Testamento, as palavras de Jesus
são, realmente, a Palavra de Deus.
Lutero
combateu a venda de indulgências e das outras superstições da igreja medieval
porque ele percebeu que estas coisas não estavam baseadas na Bíblia. No
entanto, ele se tornou a figura central de uma controvérsia intensa. O papa e o
imperador se tornaram contra Lutero violentamente, e os príncipes da Alemanha
receberam ordens para avançarem contra ele. O papa exigiu que Lutero se
apresentasse em Roma para responder às acusações que pesavam contra ele.
Lutero, no entanto, tinha um protetor, Frederico o Sábio, Príncipe da Saxônia.
Frederico sabia que Lutero não receberia uma chance justa em um tribunal em
Roma. Se ele teria de ser julgado, teria que ser em um tribunal na Alemanha.
Finalmente, tudo foi organizado, e em abril de 1521, o “santo imperador
romano”, Carlos V foi à pequena cidade de Worms, na Alemanha, onde ele havia
convocado uma assembléia imperial.
Lá
em Worms, estavam unidos os bispos, arcebispo, príncipes do Império,
representantes das cidades livres e bem no alto, acima de todos esta o augusto
Carlos V, Rei da Espanha e ‘santo imperador de Roma’.
Diante
daquela assembléia imponente esta o humilde monge Agostiniano, Martinho Lutero,
vestido com seu capuz de monge, de pé diante de uma mesa onde estavam folhetos
e tratados escritos e publicados por ele. Johaun Von Eck, assistente do
Arcebispo de Trier, que serviu como interrogador, mandou Lutero reconhecer o
material como sendo seu mesmo, e Lutero assumiu a autoria de todo o material.
Eck também perguntou se o teólogo iria se retratar das “heresias” que havia
publicado. Percebendo a importância da sua postura, Lutero pediu um tempo para
escrever uma resposta formal. Foram-lhe concedidas 24 horas para preparar a sua
resposta e no dia seguinte ele estava diante da Assembléia e pronunciou o
discurso que mudou o curso da História e modificou a Igreja para sempre. O
mundo e a Igreja jamais voltaram a ser os mesmo depois que Lutero fez a sua
declaração arrebatadora.
Um
simples monge e um teólogo obscuro, sem fortuna ou poder, Lutero ficou diante
dos governantes da Alemanha e disse: “Desde que vossa serena majestade e vossas
senhorias buscam uma resposta simples, eu a darei assim, sem chifres nem
dentes. A menos que seja convencido pelo testemunho das Escrituras ou por mera
razão (pois não confio nem no papa nem nos concílios somente, pois é bem sabido
que eles freqüentemente erram e se contradizem), eu estou atado pelas
Escrituras que já citei, e a minha consciência é escrava da Palavra de Deus. Eu
não posso e não irei me retratar de nada, já que não é seguro nem correto agir
contra a consciência”.
Lutero
talvez estivesse ali tremendo, pois ele sabia que havia arriscado sua vida por
Jesus Cristo. Outros que haviam tomado este tipo de atitude antes de Lutero
haviam sido queimados como traidores. De fato, o reformador John Hus havia sido
queimado por ordem do Concílio de Constança 100 anos antes, e entre os crimes
que o levaram a morte, foi ter protestado contra a venda de indulgências!
Ao
defender o seu ponto de vista diante daquela Assembléia, Lutero sabia que a sua
vida corria um grande risco. O imperador, em favor de Lutero, manteve a sua
palavra de que Lutero poderia ir até Worms e sair de lá em segurança, mas a
partir daquele momento seria considerado herege diante da Igreja e um
fora-da-lei aos olhos do imperador. Lutero havia proclamado o princípio que
estava destinado a ecoar através dos tempos, o princípio de SOLA SCRIPTURA.
Aqueles que acreditam como ele, anda defendem só as Escrituras e, como Lutero,
as suas consciências estão “presas à Palavra de Deus”.
Pouco
depois do protesto de Lutero e de ter iniciado a Reforma da Igreja na Alemanha,
outros, em várias partes do mundo cristão, também se voltaram para a Bíblia e
nela descobriram as verdades que haviam ficado obscuras através dos séculos de
tradições eclesiásticas. Nas montanhas da Suíça, João Calvino surgiu como um
líder da Reforma. Ele, como Lutero, se tornou um fervoroso estudante da Bíblia,
e para ele, também, a Escritura era a autoridade suprema. Calvino, falando a
respeito do Livro Sagrado, disse: “Os profetas não falavam por vontade própria,
eles eram instrumentos do Espírito Santo usados para dizer apenas o que era
enviado dos céus”. Os protestantes suíços, como seus irmãos alemães, eram
protestantes verdadeiros pois sempre exigiam que cada assunto fosse testado
pela autoridade de SOLA SCRIPTURA.
Eles
também não confiavam nos papas nem nos concílios, pois as suas consciências estavam
cativas ou presas à Palavra de Deus. O Protestantismo genuíno em qualquer lugar
declara que a Bíblia, unicamente a Bíblia, é a autoridade da fé cristã e de
prática de vida, pois esta é a fé dos nossos pais, “a fé que uma vez por todas
foi entregue aos santos”. (Jd.3)
Entre
as declarações protestantes de confiança na verdade e na confiabilidade das
Escrituras, a da confissão de Fé [Batista] de New Hampshire é majestosa e
inequívoca. Aquela afirmação batista diz: “Nós cremos que a Bíblia Sagrada foi
escrita por homens divinamente inspirados, e que é um perfeito tesouro de
instrução celestial; que Deus é o seu autor, a salvação o seu propósito, e a
verdade, sem qualquer mistura de erro em sua essência revela os princípios
pelos quais Deus irá julgar-nos, e então é, e irá permanecer até o fim do
mundo, o verdadeiro centro da união cristã, e o padrão supremo pelo qual toda a
conduta humana, credos e opiniões devem ser testadas”.
Com
esta afirmação retumbante de SOLA SCRIPTURA todos os verdadeiros cristãos irão
concordar. SOLA SCRIPTURA é o fundamento indispensável da fé cristã. Se a
Igreja do século XX não for fiel em proclamar SOLA SCRIPTURA, chegou a hora de
outro protesto, um protesto contra os projetos humanos e a favor da Palavra de
Deus.
SOLA
GRATIA: O Protestantismo, já que é baseado nas Escrituras, ensina que o homem
pecador não tem qualquer esperança de salvação através de seu próprio esforço,
pois os protestantes sabem que a Bíblia diz claramente: “Pela graça sois
salvos, por meio da fé - isto não vem de vós, é Dom de Deus - não de obras,
para que ninguém se glorie” (Ef. 2:8-9). O Protestantismo, assim, nega todos os
esquemas de salvação que promovem o homem e suas atividades e cerimônias
religiosas como meio de vida eterna e perdão. Insiste ainda que a salvação vem
através do puro e imerecido favor de Deus, pela graça somente. SOLA GRATIA é um
ensinamento cardeal da fé protestante. Os protestantes sabem que o homem é
deficiente tanto no querer quanto na habilidade de agradar a Deus e de ganhar
ou conquistar a salvação. Lutero descreveu o estado pecaminoso do homem como
sendo a condição de arbítrio escravo (escravidão da vontade).
O
homem, em sua insensatez, pensa que é livre, mas ele está realmente escravizado
pelo pecado e por Satanás. Jesus disse: “... Todo o que comete pecado é escravo
do pecado” (Jo.8:34). O homem possui um tipo de liberdade, é claro. De fato,
ele é livre para fazer o que quer, mas o que ele quer é pecar! Os desejos
pecaminosos o levam cada vez mais a pecar e cada vez mais para longe de Deus,
vivendo em pecado, amando o pecado, e se não for pela misericórdia de Deus,
morrendo em pecado. A escravidão do homem é tão completa que ele fica
alegremente desapercebido da sua condição de escravo.
Lutero
refletia a respeito da trágica condição do homem caído e a descrevia desta
maneira: “Eu creio que não posso por minha própria razão ou força, acreditar em
Jesus Cristo meu Senhor, ou buscá-lo; mas o Espírito santo me chamou através do
Evangelho, me iluminou pelos Seus dons, e me santificou e preservou na
verdadeira fé; da mesma maneira Ele chama, reúne, ilumina e santifica toda a
Igreja cristã da terra, e preserva a sua união com Jesus Cristo na verdadeira
fé ...”
Este
é o evangelho da SOLA GRATIA! Este é o ensinamento que, aos pecadores sem esperança
e incapazes, aos quais Deus não deve nada, e Ele sente piedade e derrama o seu
favor de graça. Pecadores que não merecem nada além da ira de Deus, ganham o
inestimável privilégio de gozar do seu favor, pois Deus, da bondade do Seu ser,
escolheu ser gracioso para com pessoas que só mereciam o Seu julgamento.
O
verdadeiro protestantismo tira a sua doutrina da salvação diretamente da Bíblia
e assim declara que a salvação é um presente de Deus, espontâneo, imerecido,
dado a pessoas indignas, “... a graça de Deus se manifestou salvadora ...”
(Tito 2:11), e assim, o verdadeiro Protestantismo declara SOLA GRATIA ao mundo
inteiro. O que o homem não pode fazer por si mesmo, Deus já fez por ele através
da Sua graça em Cristo Jesus. Se a Igreja do século vinte está negligenciando
declarar o Evangelho da SOLA GRATIA, é chegada a hora de um novo protesto! Os
protestantes agora, como no século dezesseis, devem insistir que a questão da
salvação seja resolvida nas Escrituras, que proclamam que é um presente, não
uma recompensa por qualquer esforço humano.
SOLA
FIDE: O Protestantismo afirma que a Bíblia é a única autoridade e que a graça é
o único meio de salvação. Isto, no entanto, deixa uma pergunta ainda sem
resposta. Como é que uma pessoa pode receber a salvação? Ou, dito de outra
maneira, como é que uma pessoa pode estar com deus? Esta foi a pergunta que
deixou Lutero perplexo e o levou quase ao desespero.
Lutero
não se tornou monge por opção. Enquanto ainda era um jovem estudante, preparando-se
para a carreira de advogado, Lutero estava viajando por uma floresta na
Alemanha quando de repente caiu uma terrível tempestade. Os trovões estrondavam
sobre sua cabeça e os raios atingiam as árvores. O jovem temeu ser consumido
por um raio e na sua angústia ele orou. Lutero orou, mas não a Deus; ele
implorou a ajuda de santa Ana, a santa padroeira dos mineiros. O pai de Lutero
havia trabalhado nas minas, então Lutero se lembrou da infância quando o pai
dava instruções que o ensinavam a buscar a ajuda de santa Ana como mediadora
para falar com Deus. Ele prometeu a santa Ana que se tornaria um monge se a sua
vida viesse a ser poupada. Ele sobreviveu àquele tenebroso temporal, e foi fiel
a sua promessa entrando no monastério da ordem Agostiniana em Emfurt. Como ele
se tornou um padre, e, enquanto estava no monastério, se dedicou às
responsabilidades da vida em comunidade, com um vigor incomum. Passava noites
sem dormir, em jejuns e orações. Procurava confessar os seus pecados todos os
dias, em sua busca de acertar com Deus.
O
padre Johan Stauptz, superior monástico de Lutero, percebeu que este monge era
um homem com uma consciência notavelmente sensível. Lutero se sentia tão
oprimido com a sensação de pecado e de culpa que ele não podia confessar o
suficiente, e finalmente Stauptz disse que Lutero saísse do confessionário e só
voltasse quando tivesse realmente pecado para confessar! Lutero estava
vasculhando a sua consciência no esforço de conseguir aliviar o terrível peso
da culpa e da vergonha, mas a confissão a um padre não o ajudou em nada.
Apesar
da Igreja medieval incentivar as pessoas a adotarem uma vida monástica como a
melhor forma de ganhar o favor de Deus, a experiência no monastério, no caso de
Lutero, não o ensinou a amar a Deus. Lutero mesmo admitiu que se tornou mais
alienado e distante do seu Criador ao mesmo tempo em que buscava servir mais
fielmente. Como ele mesmo colocou: “Eu... estava sendo atormentado
perpetuamente”.
Os
estudos de Lutero no monastério e na universidade, como também na infância, o
ensinaram a considerar Deus como um severo juiz, então ele ficava aterrorizado
com a possibilidade de não estar entre os escolhidos de Deus. Ele confessou
suas dúvidas ao padre Stauptz, e o sábio conselheiro o incentivou a parar de
estudar e meditar na ira de Deus e na Sua justiça, e começar a meditar no amor
e misericórdia de Deus. Stauptz mandou Lutero olhar as chagas de Cristo e
acreditar que Ele foi crucificado por ele, e assim o monge encontraria a
certeza do amor de Deus e do Seu favor. Lutero levou este conselho a sério, mas
as dúvidas ainda o atacavam, pois ele não podia livrar-se da imagem de Deus
como um juiz irado.
O
estudo da Bíblia foi uma das responsabilidades de Lutero como padre e teólogo,
mas mesmo este sagrado exercício, a princípio, parecia aumentar o senso de que
era um miserável. Quando encontrava a ênfase bíblica da justiça de Deus, Lutero
percebia que a justiça perfeita de Deus exige a perfeição do homem. Mas, não
importava o seu esforço, pois Lutero não conseguia atingir a retidão exigida
pelo Criador; o monge atribulado continuava a afundar em uma miséria mental e espiritual
por não conseguir apaziguar a ira de Deus contra quem havia pecado. O Deus
justo que Lutero encontrou na Bíblia permanecia na sua mente como um juiz de
acusação, cujas leis haviam sido quebradas.
Na
universidade de Wittemberg, Martinho Lutero recebeu a responsabilidade de fazer
estudos de passagens bíblicas, e, em 1515, dois anos antes de Ter afixado suas
95 teses, ele iniciou uma série de palestras na epístola aos Romanos. Neste
grande tratado de Paulo, Lutero descobriu o coração do Evangelho no capítulo 1,
versos 16 e 17: "Pois não me envergonho do Evangelho, porque é o poder de
Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do
grego; visto que a justiça de Deus se revela no Evangelho, de fé em fé, como
está escrito: “O justo viverá por fé”.
A
retidão que Lutero precisava, mas que não tinha poder de produzir, ele
encontrou no evangelho de Cristo. Ele descobriu que é uma retidão que vem de
Deus! A retidão que Deus exige, é a retidão que Ele mesmo fornece, através da
fé no Seu Filho. Aí está o coração da fé cristã - o homem pecador é
justificado, isto é, obtém uma vida reta diante de Deus, SOLA FIDE, através da
fé somente.
Quando
Lutero fez a descoberta da justificação através unicamente da é, ele exclamou:
“Eu senti que havia realmente nascido novamente e que havia entrado no próprio
paraíso através dos portões abertos. Ali uma face totalmente diferente das
Escrituras tornou-se clara para mim”.
Sim,
um milagre havia acontecido no coração e na alma de Martinho Lutero. Enquanto
ele estudava a palavra de Deus, o Espírito de Deus lhe concedeu a vida
espiritual, o regenerou e lhe deu a fé para crer e compreender a justificação,
a retidão que ele necessitava tão desesperadamente; havia-lhe sido dada pelo
Filho de Deus. O Protestantismo proclama que a fé, somente a fé justifica o
pecador, isto é, o declara justificado diante de Deus.
O
catecismo de Heidelberg é uma das grandes declarações da Reforma Protestante, e
a sua definição de fé salvadora é especialmente pertinente: “A verdadeira fé
não é meramente o conhecimento de que eu declaro saber ser a verdade tudo o que
Deus revelou através da Bíblia, mas também é a firme confiança de que o
Espírito Santo trabalha no meu coração pelo Evangelho; que não só para os
outros, mas para mim também, a remissão dos pecados, a justificação eterna e a
salvação são gratuitamente dadas por Deus meramente pela graça, só pelo méritos
de Jesus Cristo”.
Aí
está! O pecador, sem qualquer mérito próprio apresenta diante de Deus os
perfeitos méritos de Jesus Cristo que é a suprema benevolência do céu descendo
para alcançar os pecadores que não podem alcançar a deus,. Como Jesus colocou
isso: “Porque o Filho do Homem veio buscar e salvar o perdido” (Lc. 19:10). Ele
veio buscar homens que, por natureza, jamais O buscariam. Ele amava tanto os
pecadores perdidos que Ele os perseguia ao fugirem dEle, alcançou-os durante a
fuga, e pelo toque suave da sua graça os transformou e guiou para o céu. Paulo
descreve essa salvação de forma belíssima: “Quando, porém, se manifestar a
benignidade de Deus, nosso Salvador, e o Seu amor para com todos os homens não
por obra de justiça praticada por nós, mas segundo a Sua misericórdia Ele nos
salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, que ele
derramou sobre nós ricamente por meio de Jesus Cristo nosso Salvador” (Tt.
3:4-6).
Martinho
Lutero sabia que havia recebido o presente preciosos de Deus, a fé
justificadora em Jesus Cristo. E quanto a nós? Ao considerarmos os três grandes
princípios do Protestantismo cremos na Bíblia? Estamos firmados na SOLA
SCRIPTURA, só na Palavra de Deus? Temos abandonado todos os esforços de nos
salvar por nós mesmos? Podemos nós apresentar-nos diante de Deus salvos por
Cristo, SOLA GRATIA? Já confessamos os nossos pecados e sabemos da nossa
condição de pecadores perdidos? Sentimo-nos sem esperança e incapazes como
Lutero? Cremos que, pela fé, Cristo morreu por nossos pecados e ressuscitou? Se
respondemos afirmativamente, nós também nascemos de novo; nós também, encontramos
os portões abertos do paraíso; nós também, temos recebido a justificação que
vem de Deus, que é “do primeiro ao último através da fé”, pois nós “que através
da fé fomos justificados, viveremos!”.
Na
última década deste século, mais de quinhentos anos depois do nascimento de
Lutero em 1483, a Igreja contemporânea deve proclamar o Evangelho de SOLA FIDE.
Se a Igreja da nossa geração não estiver fazendo isto, chegou a hora,
novamente, de protestar! Vamos transformar a nossa Igreja em realmente
Protestante novamente. Vamos testemunhar de Cristo e pela Palavra de Deus.
Vamos protestar contra os desígnios humanos e as falsas tradições. Nós
precisamos de um reavivamento do genuíno testemunho Protestante, pois estes
princípios estão sendo descartados, apesar de virem da Bíblia e terem sido
escritos com sangue dos mártires.
Vamos
protestar, antes que o verdadeiro Protestantismo se perca por omissão e
negligência. Aqui está a fé dos nossos pais, a fé pela qual viveram e pela qual
morreram. Esta é a fé que permitiu que Lutero ficasse de pé diante da igreja e
do império e declarar: “A minha consciência está presa à Palavra de Deus”. Esta
é a fé que sustentou o mártir protestante inglês Thomas Cranmer, arcebispo de
Cantebury, que morreu queimado durante o reinado de Maria a Sangüinária. Que em
momento anterior de fraqueza, havia negado a sua fé para salvar a sua vida,
mais que recuperou a sua coragem e pagou o preço pela lealdade ao Senhor.
Quando o fogo foi colocado aos seus pés, Thomas Cranmer colocou sua mão direita
dentro das chamas e clamou: “Porque a minha mão ofendeu ao escrever o contrário
do que dizia meu coração, ela será queimada primeiro”.
Como
Lutero, Cranmer e outros mártires creram nos três princípios do Protestantismo
e sabiam que não podiam negá-los sem negar o próprio Jesus Cristo. Que Deus nos
dê coragem de viver pela mesma fé e de morrer nela.
“Eterno
Deus e Pai do Nosso Senhor Jesus Cristo, dá-nos o Teu Espírito Santo que
escreve a Palavra pregada em nossos corações. Que nós possamos receber e crer
no Teu Espírito para sermos regozijados e confortados por Ele na eternidade.
Glorifica a Tua palavra em nossos corações e faz com que ela seja tão brilhante
e quente que nós possamos achar prazer nela, através do Teu Espírito Santo,
pensar o que é certo, e pelo Teu poder cumprir a Tua Palavra por amor de Jesus
Cristo, Teu Filho, Nosso Senhor. Amém!” (Martinho Lutero).
Tradução: Débora M. G. Gomes
Nota
sobre o Autor: Dr. James McGoldrick é professor de História no Cedarville
College, em Ohio, Estados Unidos. Ele é um dedicado estudioso da História da
Reforma. Este artigo foi originalmente publicado na revista The Banner of
Truth, Nº. 232, em Janeiro de 1983 e aqui transcrito do jornal “Os Puritanos”
Nº.4 de Julho/Agosto de 1994.
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