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“Sabemos
que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que
são chamados segundo o seu propósito.” Rm 8:28
Em
Romanos 8:28 Paulo expõe uma profunda e consoladora verdade para o crente
genuíno, “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a
Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”.
A
vida do cristão assemelha-se ao mecanismo de um relógio. O que você vê ao abrir
um relógio? Vê que certas engrenagens que giram em sentido anti-horário estão
atreladas a outras que trabalham no sentido horário. A sua primeira impressão
pode pode ser de que o mestre relojoeiro está louco ou confuso.
Pelo
contrário, ele arrumou de tal forma o mecanismo desse relógio e colocou uma
mola mestra para controlar todas as suas engrenagens, que quando recebe corda,
embora uma engrenagem gire no sentido horário e outra no sentido anti-horário,
todas trabalham juntas para mover os ponteiros em torno do mostrador
precisamente na velocidade certa. Muitas engrenagens parecem trabalhar umas
contra as outras, mas todas trabalham juntas com o mesmo propósito de mostrar o
tempo exato.
Isso
é apenas uma alegoria da vida do povo de Deus. Algumas engrenagens nas suas
vidas giram em sentido horário, as quais provêem esperança de que os fatos que
ocorrem em suas vidas, dirigidos pela providência de Deus são bons para eles,
mas outros atos da providência de Deus parecem ocorrer no sentido contrário, ou
seja, contra eles. Somente quando seus olhos da fé estão fixos no grande
Mestre-Relojoeiro, que planejou todas as coisas segundo seu sábio decreto, eles
vêem e compreendem que Ele ajustou a mola mestra da graça nas suas vidas, de
maneira que todas as engrenagens espirituais e providenciais cooperam para o
seu bem estar. Sim, irmão, embora muitas vezes pareça que tudo está girando no
sentido anti-horário e contra você, embora às vezes você veja uma engrenagem da
providência trabalhar contra uma engrenagem da graça em várias aflições e
provações, ainda assim o seu sábio Deus sabe exatamente tudo o que Ele está
fazendo. Ele fará todas as coisas cooperarem para a produção de um abençoado e
divino resultado segundo o Seu soberano beneplácito e eterno conselho.
Paulo
não faz qualquer exceção a essa promessa. Ele diz “todas as coisas - isso
inclui todas as coisas boas e todas as coisas ruins - cooperam para o bem”. As
melhores coisas - incluindo os atributos e as obras de Deus, as promessas e
providências do Pai, a obra e a pessoa do Filho, a graça e a obra do Espírito,
o eterno pacto da graça com todos os benefícios da salvação que o acompanham, e
as divinas ordenanças, como a Palavra, os sacramentos, a oração e a comunhão
dos santos - todas cooperam para o seu bem verdadeiro se você é um daqueles que
verdadeiramente amam ao Deus das Escrituras. Até mesmo as piores coisas
-incluindo o afastamento de Deus, o pecado, satanás, enfermidades, tentações,
aflições, perseguições, - cooperam para o seu bem e para a glória de Deus.
Sem
dúvida alguns de nós dirão, “é fácil compreender que as coisas boas cooperam
para o bem, e eu sei que as coisa ruins devem cooperar para o bem estar
espiritual do povo de Deus, mas como a aflição, o afastamento de Deus, e até
mesmo o pecado podem cooperar para o meu bem, isso eu não consigo compreender!”
Hoje
e na mensagem da próxima semana eu desejo expor a vocês algumas maneiras diferentes
como até mesmo essa três coisas - a aflição, a interrupção da comunhão com Deus
e o pecado - cooperam para o bem estar espiritual dos filhos de Deus, para que,
a partir do exposto, nós sejamos capazes de concluir com segurança que “todas
as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus”. Hoje vamos nos deter
no benefício que a aflição traz para o crente, e na próxima semana veremos
então como a deserção divina e o pecado podem resultar em bem.
Ninguém
naturalmente gosta da aflição. Aflições podem ser muito pesadas e difíceis de
suportar. “Se o pecado é a cabeça da serpente,” escreveu Ralph Erskine, “a
aflição é a sua cauda”. E mais, caro irmão, não é certo que a aflição também
serve como um remédio para você nas mãos do seu grande Médico, Jesus Cristo?
Vejamos resumidamente nove maneiras diferentes as quais nas mãos dEle as suas
aflições cooperam para o seu bem estar espiritual e eterna saúde.
Primeiro,
o Senhor, através da aflição, não o humilha profundamente, mostrando quem você
é e o que existe dentro de você - nada além de pecado e corrupção, a parte da
graça divina? Não lhe ensina o Senhor através da aflição a mesma verdade que
Ele ensinou a Israel em Deuteronômio 8, “que te conduziu por aquele grande e
terrível deserto de serpentes abrasadoras, de escorpiões, e de secura, em que
não havia água... que no deserto te sustentou com maná..., para te humilhar, e
para te provar, e afinal te fazer bem” (Dt 8:15,16)?
A
aflição não só faz o verdadeiro crente se humilhar diante de Deus, mas o
conserva humilde. A aflição faz secar o reservatório do combustível que
alimenta o seu orgulho. Um crente aflito é semelhante uma árvore carregada de
frutos; a árvore que mais se dobra ao chão é freqüentemente a que está mais
cheia de frutos. Se Deus utilizar a aflição para humilhá-lo perante Ele, não
estará a sua aflição cooperando para o bem?
Segundo,
através da aflição o povo de Deus aprende o que é o pecado na sua desonrosa,
corrompida e maldita natureza. Através da aflição eles aprendem que, como foi
apropriadamente dito, “o pecado tem o diabo por pai, a vergonha por
companheira, e a morte por seu salário”. Eles aprendem pela aflição que o
pecado na verdade é um ataque ao coração, ao ser, e aos atributos de Deus. Como
escreveu John Bunyan, “o pecado é uma afronta a justiça de Deus, uma violência
contra a sua misericórdia, é escarnecer da Sua paciência, é menosprezar o Seu
poder, e desrespeitar o Seu amor”. Eles aprendem através da aflição que o
pecado é tanto a força da sua morte, como a morte da sua força.
Na
aflição é como se a alma do crente fosse esquadrinhada com lanternas expondo os
pecados ocultos e notórios. Quando a aflição é santificada pelo Espírito Santo,
o pecado é arrancado do seu esconderijo dentro do coração e trazido à luz dos
santos e prescutadores olhos de Deus. A aflição arranca a folha de figueira que
cobre o filho de Deus. “Os pecados do povo de Deus são como ninhos”, escreveu o
puritano William Bridge, “enquanto as folhas estiverem na árvore você não pode
vê-los, mas no inverno da aflição quando todas as folhas caem, os ninhos
aparecem claramente”. Quando a aflição é santificada, o pecado se torna
hediondo e odioso. O pecado se torna excessivamente pecaminoso em sua
verdadeira natureza. Torna-se mais odiado por sua natureza do que por suas
conseqüências.
Terceiro,
o Espírito Santo usa a aflição como um remédio para acabar com a enfermidade
mortal do pecado nos filhos de Deus, fazendo-os produzir frutos saudáveis e
piedosos. Quando o pecado faz o crente se desviar do seu Salvador, o Senhor
Jesus, como um Bom Pastor, usa a vara da aflição para aprumá-lo novamente. A
aflição é o cão do Pastor, enviado não para devorar as ovelhas, mas para
trazê-la de volta ao aprisco. A aflição trata do pecado. “Antes de ser afligido
andava errado”; confessa Davi, “mas agora guardo a tua palavra” (Sl 119:67).
Para
um filho de Deus, ser afligido é um bem como é a poda para a jovem árvore pois
a pressão da aflição não só remove o terrível mau cheiro do pecado, mas também
revela as fragrâncias e os frutos da graça divina. Você sabe que em alguns
países certas árvores crescem mas não dão fruto por não haver inverno ali? O
cristão precisa de invernos de aflições para experimentar o florescer das
primaveras, o crescimento do verão e a colheita de outono.
A
vida dos filhos de Deus é como um sino - quanto mais forte se bate, melhor ela
toca. Eles aprendem mais sob a vara que os disciplina do que sob o cajado que os
consola. O Bom Pastor não está afogando suas ovelhas quando as lava, nem as
está matando quando tosquia. Pelo contrário, sua lavagem é uma higiene
necessária; a tosquia um privação necessária, e suas correções são lições
essenciais.
A
aflição colhe frutos preciosos. Ela garimpa, funde, refina e forja o crente até
que o divino Ourives possa ver o seu reflexo na obra das Suas próprias mãos.
Então o Cristão experimenta com Jó, “se Ele me provasse, sairia eu como o ouro”
(Jó 23:10). “A aflição”, escreveu Robert Leighton, “é o pó de diamante com que
o céu poli as suas jóias”.
Quarto,
o Senhor se utiliza a aflição como um meio de fazer o seu povo buscá-lo, para
trazê-lo de volta à comunhão com Ele, e mantê-lo junto ao Seu lado. Como na
tempestade as ovelhas buscam estar junto do seu pastor, assim diz o Senhor de
Israel, “estando eles angustiados, cedo me buscarão” (Os 5:15). As tempestades
e o granizo da aflição leva as ovelhas para mais perto do seu Pastor. Todas as
pedras que atingiram Estevão apenas o empurraram para mais perto da pedra
angular, Jesus Cristo, e abriram ainda mais o céu para a sua alma. A aflição
levou a mulher cananéia ao Filho de Davi; conduziu o ladrão na cruz ao seu Salvador.
Não foi a coroa de Manassés, mas suas cadeias, que o fizeram reconhecer que “o
Senhor era Deus”. Mesmo o imã da rica misericórdia de Deus não traz e mantém
tão perto o rebanho do seu Grande Pastor como as cordas da aflição.
Quinto,
o Senhor usa as aflições moldar o seu rebanho à semelhança de Cristo fazendo-o
participante dos seus sofrimentos e da sua imagem. Cristo foi castigado “para
(o nosso) aproveitamento”, o autor de Hebreus escreveu, “a fim de sermos
participantes da sua santidade” (Hb 12:10). Deus tinha apenas um Filho sem
pecado, mas nenhum sem aflição. A sua vara de aflição é como um lápis com que
ele traça a imagem de Cristo mais firmemente em seu povo. Pelo caminho da
aflição rumo à glória eles se tornam seguidores do Cordeiro de Deus que caminha
adiante do seu rebanho. Todo caminho de aflição que eles encontram já foi
trilhado, conquistado e santificado pelo seu Pastor cujo sangue substitutivo,
desde a sua circuncisão até a cruz, é a sua garantia segura de que nenhuma
aflição ou provação será capaz de separá-los do amor de Deus em Cristo Jesus
(Rm 8:39). Os seus merecidos sofrimentos os conduzem ao sofrimento substitutivo
de Cristo, o qual por sua vez, os faz exclamar “o seu jugo é suave e o seu
fardo é leve” (Mt 11:30). Caro irmão, não é nos tempos de sofrimento que
normalmente você tem mais comunhão com Jesus Cristo em seus sofrimentos - cuja
a vida inteira, como diz Calvino, não foi outra coisa senão uma série de sofrimentos?
Pode então você reclamar da leve cruz que você tem de suportar sendo um pecador
culpado quando você vê a pesada cruz que Cristo teve de suportar sendo
inocente?
Sexto,
as aflições espirituais cooperam para o nosso bem porque o Senhor os
contrabalança com consolo e alegria espirituais. “A vossa tristeza”, disse
Jesus aos discípulos, “se converterá em alegria” (Jo 16:20). Ele leva o seu
povo ao deserto para lhes falar ao coração (Os 2:14). Onde quer que abundem os
sofrimentos de Deus, abunda a consolação de Deus (2 Co 1:4,5). A vara do Pastor
possui mel em sua ponta. Todo Paulo tem sua canção para cantar na prisão. O
doce seguirá o amargo. A alegria virá pela manhã. O Senhor transformará a sua
água em vinho. Samuel Rutherford uma vez escreveu, “quando eu estou no porão da
aflição (é a mesma palavra para adega no inglês: cellar), eu encontro os
melhores vinhos do Senhor”. Na aflição, as ovelhas de Deus às vezes
experimentam doces êxtases de divina alegria, que as levam como que, bem nos
limites das fronteiras da Canaã celestial. Em tais momentos eles podem
confessar com Elifaz o temanita, “bem aventurado é o homem a quem Deus
disciplina; não despreze, pois, a disciplina do Todo-Poderoso. Porque Ele faz a
ferida e Ele mesmo a ata; Ele fere, e as suas mãos curam. De seis angústias te
livrará, e na sétima o mal te não tocará” (Jó 5:17-19).
Sétimo,
a aflição também coopera para o bem fazendo os filhos de Deus andar por fé e
não por vista. Se fosse permitido ao crente sempre desfrutar dos a prazeres e
alegrias deste mundo, eles passariam a amar esta vida e a depender das suas
provisões espirituais ao invés de depender dAquele que tudo provê. Por isso,
juntamente com as suas doces iguarias, o Senhor serve um pouco de molho azedo
para ajudar na digestão, para que eles vivam, não por seus sentidos, mas pela
fé. Na prosperidade o povo de Deus fala de viver pela fé; muitas vezes
conselhos obscuros de palavras sem conhecimento; mas é na adversidade que eles
alcançam o conhecimento prático do que é viver pela fé.
Oitavo,
a aflição coopera para o bem quando desliga e afasta os cristãos das coisas
deste mundo. Um cão nunca morde aqueles que são de casa, somente os estranhos.
A aflição morde tão profundamente os filhos de Deus porque eles ficam tão pouco
em casa com a Palavra e os costumes de Deus, e tempo demais com o mundo e os
costumes dos homens. Se eles estivessem mais vezes em casa com o seu Mestre e
Pastor nos lugares celestiais, as aflições seriam muito mais fáceis de
suportar. “Deus”, diz Thomas Watson, “tem o mundo como um dente mole, prestes a
cair, que quando arrancado, não nos cria mais problema”.
Finalmente,
a aflição é proveitosa para preparar o povo de Deus para a sua herança celestial.
A aflição eleva as suas almas até o céu, para buscarem “a cidade que tem
fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador” (Hb 11:10). A aflição
pavimenta o seu caminho para a glória. “Porque a nossa leve e momentânea
tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2
Co 4:17). “Aquele que corre para receber a coroa”, escreveu John Trapp, “não se
incomodará muito com um dia chuvoso”.
Filhos
de Deus, isso não é suficiente para convencê-lo que a aflição é para o seu bem
- que “nada” de bom ou necessário “faltará” a vocês, tanto temporal como
espiritualmente? Ainda que o vento da aflição seja contrário à sua carne, Deus
se agrada em usá-lo para conduzir você ao céu. As suas aflições são sob medida
para ajustarem-se com precisão divina a você durante todo o caminho para a
glória. “Em tudo (até mesmo nas aflições) dai graças, porque esta é a vontade
de Deus em Cristo Jesus para convosco” (1 Ts 5:18).
Mensagem
pregada pelo Dr. Joel R. Beek no ministério radiofônico (The Gospel Trumpet
Broadcast) das Congregações da Herança Reformada Holandesa.
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