Alderi S. Matos
Testemunha-se hoje um renovado
interesse na diaconia cristã e em suas implicações para a igreja e a sociedade.
Diferentes denominações e entidades cristãs cooperativas têm participado de uma
constante discussão e reflexão teológica acerca do seu significado e relevância
para os tempos atuais. Cresce entre muitos cristãos a consciência de que a
diaconia é crucial para a fé, a vida e a missão da igreja.
Muitas vezes um tema negligenciado
e mal compreendido no pensamento e na prática cristã, o serviço cristão cada
vez mais tem sido entendido como "inseparável da essência da igreja… ‘a
liturgia após a liturgia,’ a continuação no mundo da vida de adoração da comunidade."1 Por esta razão, "a diaconia deve ser
legitimada não somente como uma função cristã, mas como o modo de ser da
igreja."2
No Brasil, infelizmente, muitas
igrejas evangélicas ainda não consideram este tema como prioritário em sua
agenda. As próprias igrejas presbiterianas, apesar de possuírem uma rica
herança nessa área, não têm na prática revelado grande interesse na dimensão
diaconal e social da igreja. Uma boa ilustração dessa atitude pode ser vista no
empobrecimento do ofício do diaconato em nossas comunidades. Em muitas igrejas,
os diáconos limitam-se a atividades tais como auxiliar a manutenção da ordem
durante os cultos e recolher as contribuições dos fiéis. Todavia, por ser um
conceito central nas Escrituras, na ética e na teologia, a diaconia cristã deve
ter alta prioridade na vida e no testemunho da igreja.
O objetivo deste trabalho é
considerar o ensino e a prática de João Calvino com respeito ao diaconato e à
ação social, e demonstrar como ele, à semelhança dos outros reformadores,
"redescobriu a função de serviço social desempenhada pelo diácono na
igreja primitiva."3 Após uma breve
abordagem da vida de Calvino até o início do seu ministério em Genebra, destacaremos
alguns aspectos relevantes do seu pensamento social, bem como as suas idéias
sobre o diaconato. Será dada uma atenção especial às diferentes interpretações
propostas quanto à fonte do conceito de Calvino acerca do duplo diaconato. Além
disso, discutiremos dois notáveis exemplos de como as idéias do reformador
encontraram expressão prática na cidade de Genebra.
I. Calvino: De Noyon a Genebra4
Jean Calvin ou João Calvino
(1509-1564) nasceu em Noyon, uma pequena cidade situada a cerca de 100 km a
nordeste de Paris. Seu pai, Gérard Cauvin, era um assistente administrativo do
bispo local. Sua mãe, Jeanne, morreu quando Jean, seu quarto filho, tinha
apenas cinco ou seis anos de idade. Uma autora argumenta que essa triste
experiência certamente contribuiu para o sentimento de ansiedade e inquietação
pessoal característico de Calvino.5
Calvino viveu por vários anos com
a aristocrática família Montmor, à qual sempre se mostraria profundamente
agradecido. Ele dedicou o seu primeiro livro, em 1532, a um membro dessa
família, afirmando: "Eu lhe devo tudo o que sou e tenho… Quando menino,
fui criado em sua casa e iniciei os meus estudos com você. Assim sendo, devo à
sua nobre família o meu primeiro treinamento na vida e nas letras."6
Graças à interferência de seu
pai, com a idade de doze anos Calvino recebeu um benefício eclesiástico do
bispo de Noyon. A posse de um benefício exigia o ingresso em uma ordem menor –
João tornou-se sacristão e recebeu a tonsura – e o exercício de tarefas
eclesiásticas, no seu caso o cuidado de um dos altares da catedral. A renda
desse benefício era uma espécie de bolsa de estudos através da qual o jovem
Calvino, já então um estudante precoce, poderia continuar os seus estudos.
Em agosto de 1523 o jovem foi
para Paris a fim de iniciar os seus estudos formais. Inicialmente matriculou-se
no Collège de la Marche, onde aperfeiçoou o seu conhecimento do latim sob o
grande mestre Mathurin Cordier, que anos depois haveria de lecionar na Academia
de Genebra. A seguir, Calvino dedicou-se aos estudos teológicos no Collège de
Montaigu, famoso por sua rígida disciplina e por sua péssima comida. Sendo um estudante
compulsivo, Calvino saiu-se muito bem nos seus estudos. Ao mesmo tempo, sob
influências humanistas, ele também adquiriu uma forte antipatia pelo método
escolástico de se fazer teologia.
Em 1528, por insistência de seu
pai, Calvino mudou-se para Orléans a fim de estudar Direito. Gérard Cauvin
percebeu que o seu inteligente filho provavelmente se daria melhor como
advogado do que como religioso. Mais tarde Calvino deu prosseguimento aos seus
estudos jurídicos em Bourges, onde também estudou grego com o erudito
evangélico alemão Melchior Wolmar. Timothy George observa que o treinamento
jurídico de Calvino exerceu duas influências significativas sobre o seu futuro
trabalho: proporcionou-lhe um sólido fundamento em questões práticas que lhe
foi muito útil no seu esforço para remodelar as instituições de Genebra, e
abriu os seus olhos para a antigüidade clássica e o estudo dos textos antigos.7
Quando seu pai morreu, em 1531,
Calvino sentiu-se livre para abandonar o estudo do Direito em favor da sua
verdadeira paixão, a literatura clássica. Ele voltou para Paris e no ano
seguinte publicou o seu primeiro livro, uma edição crítica do tratado de Sêneca
Sobre a Clemência, juntamente com um extenso comentário.
A sua transição de humanista a
reformador foi marcada por algo que ele certa vez descreveu como uma
"conversão repentina" (conversio subita). Isso aconteceu por
volta de 1533-1534 e foi precedido de um período de lutas, inquietação e
dúvidas. Seus primeiros biógrafos Beza e Colladon atribuem um importante papel
na sua conversão ao seu primo Robert Olivétan, para cujo Novo Testamento
francês Calvino escreveu um prefácio sob o título: "A todos os que amam
Jesus Cristo e o seu Evangelho" (1535). Esta foi a sua primeira obra
publicada como protestante. Sua conversão foi atestada publicamente quando ele
retornou a Noyon em maio de 1534 a fim de renunciar ao benefício de que tinha
usufruído por treze anos.8
No Dia de Todos os Santos em
1533, Nicholas Cop, um amigo de Calvino que acabara de ser eleito reitor da
Universidade de Paris, fez um discurso de abertura do ano letivo que chocou a
audiência por causa de suas idéias protestantes. Acusado de ser um
propagandista luterano, Cop teve de fugir para salvar a vida. Calvino, sob
suspeita de ser o co-autor do discurso, teve seus papéis apreendidos e
tornou-se persona non grata em Paris. Ele encontrou refúgio na casa de
um amigo em Angoulême, onde começou a escrever as suas Institutas da
Religião Cristã.
Um ano mais tarde, quando
irrompeu a perseguição contra os protestantes franceses, Calvino buscou
proteção na cidade reformada de Basiléia, a terra natal de Cop, que ali já se encontrava.9
Em março de 1536 veio a lume a primeira edição das Institutas, um livro destinado
a tornar-se "o principal documento da teologia protestante no século dezesseis."10
Um bestseller quase da noite para o dia, o livro foi distribuído rapidamente
por toda a Europa. Houve duas razões principais para tamanho sucesso: a sua
carta introdutória dirigida ao rei Francisco I constituiu-se numa poderosa
defesa dos evangélicos franceses perseguidos; todavia, o seu propósito
principal foi catequético – servir como um manual para o ensino e a reforma das
igrejas. A sua edição definitiva, vastamente ampliada, seria publicada somente
em 1559.
No verão de 1536 Calvino estava
viajando com seu irmão e meio-irmã de Paris a Estrasburgo, onde esperava
instalar-se para uma vida longamente esperada de tranqüilidade e estudo.11
Todavia, os exércitos de Francisco I e do imperador Carlos V estavam empenhados
em manobras militares numa área onde os viajantes deveriam passar. Assim sendo,
estes tiveram de fazer um desvio pelo sul, através da cidade de Genebra, na
fronteira entre a França, Savóia e a Suíça. Por ironia, Calvino não teve uma boa
impressão da cidade e planejou permanecer ali apenas uma noite.
O ardoroso Guillaume Farel
(1489-1565) tinha levado a cidade a abraçar a Reforma somente dois meses antes,
através do voto unânime de uma assembléia de cidadãos realizada em 25 de maio
de 1536. A obra da Reforma em Genebra estava intimamente ligada à sua emancipação
política da Casa de Savóia, de convicção católica. Nos anos de 1526 e 1527 a
cidade tinha sido atraída para a órbita da Suíça e em 1533 Berna promovera ativamente
a causa da Reforma Protestante em Genebra.
Sabendo que Calvino estava na
cidade, Farel irrompeu em seu quarto de hotel e lhe implorou que permanecesse
em Genebra e o ajudasse a consolidar a Reforma recentemente abraçada. Calvino
ficou chocado com a idéia, pois sentiu-se despreparado para a tarefa. Ele
poderia fazer mais pela igreja através de seus tranqüilos estudos e de seus
escritos. Nesse momento, Farel trovejou a ira de Deus sobre Calvino com
palavras que este jamais iria esquecer – Deus amaldiçoaria o seu lazer e os
seus estudos se em tão grave emergência ele se retirasse, recusando-se a
ajudar. George observa que "a partir daquele momento, o destino de Calvino
ficou ligado ao de Genebra."12
A primeira estadia de Calvino em
Genebra durou menos de dois anos. O seu primeiro catecismo e confissão de fé
foram adotados, mas ele e Farel entraram em conflito com as autoridades civis
acerca de questões eclesiásticas: disciplina, adesão à confissão de fé, e
práticas litúrgicas. Em abril de 1538 eles foram expulsos da cidade. Depois de
outra breve estadia em Basiléia, Calvino transferiu-se para Estrasburgo, seu
destino original dois anos antes. Naquela cidade ele haveria de passar os três
anos mais felizes da sua vida (1538-1541). Provavelmente também foram os anos
mais decisivos da sua formação como reformador e teólogo.
Timothy George destaca cinco
dimensões da vida de Calvino durante esse período crucial.13 Primeiramente, ele
pastoreou uma pequena congregação de refugiados franceses. Em segundo lugar,
foi professor na escola de João Sturm, que serviria de modelo para a sua futura
Academia de Genebra. Calvino também escreveu extensamente: uma edição inteiramente
revista das Institutas (publicada em agosto de 1539), a sua primeira
tradução francesa (1541), o Comentário de Romanos, e três escritos mais
breves, porém brilhantes – a Resposta a Sadoleto, "provavelmente a melhor
apologia da fé reformada escrita no século dezesseis,"14 um livro de liturgia,
e um tratado sobre a Santa Ceia. Calvino ainda atuou como diplomata eclesiástico,
viajando para muitas cidades como conselheiro de delegações protestantes em
conferências interconfessionais que procuravam restaurar a unidade entre
protestantes e católicos. Finalmente, ele contraiu núpcias com uma de suas
próprias paroquianas, Idelette de Bure, em uma cerimônia oficiada por seu amigo
Farel.
Em 1541 os genebrinos suplicaram
que Calvino retornasse à sua igreja. Persuadido por Martin Bucer (1491-1551), o
grande líder da Reforma em Estrasburgo, Calvino retornou a Genebra no dia 13 de
setembro, viu-se nomeado pastor da antiga catedral de Saint Pierre e foi
"contemplado com um salário razoável, uma casa ampla, e porções anuais de
12 medidas de trigo e 250 galões de vinho."15
O restante da carreira de Calvino
como reformador foi simbolizado pelos dois primeiros atos oficiais que
empreendeu após o seu retorno. No domingo seguinte ele voltou ao seu púlpito e
simplesmente prosseguiu a exposição das Escrituras no ponto em que a havia interrompido
três anos antes. Além disso, ele apresentou ao conselho da cidade um plano detalhado
para a ordem e o governo da igreja. As suas Ordenanças Eclesiásticas requeriam
a instalação dos quatro ofícios de pastores, doutores, presbíteros e diáconos,
os quais correspondiam às áreas de doutrina, educação, disciplina e ação
social. O conselho aprovou o plano de Calvino, mas este passaria o restante da
sua carreira tentando, nunca com pleno êxito, obter o seu cumprimento.
II. O Pensamento Social de
Calvino16
O conceito de Calvino acerca de
um quádruplo ministério, mencionado acima, revela que a assistência social
estava entre as suas principais preocupações. Sua primeira e mais importante
contribuição nessa área foi teórica – suas idéias e princípios teológicos
concernentes à responsabilidade da igreja cristã para com os desafortunados. O
pensamento social de Calvino sobre riqueza e pobreza, bem-estar social e
questões correlatas pode ser encontrado em diversas fontes, principalmente nas
Institutas, nos comentários bíblicos e em sermões.
Vários autores observam que
Calvino jamais estabeleceu uma conexão entre riqueza ou pobreza e o favor ou
desfavor de Deus em relação a indivíduos. W. Fred Graham argumenta que
Calvino nunca
viu a pobreza e o infortúnio como evidências do desfavor de Deus para com o
indivíduo afligido, nem considerava a prosperidade como um sinal da bênção de
Deus por causa de méritos pessoais ou como evidência da eleição para a
salvação.17
Antes, o reformador entendeu a
riqueza e a pobreza como expressões do favor ou do julgamento de Deus sobre
toda a comunidade, que então deveria redistribuir os seus recursos com vistas
ao bem-comum. Calvino pergunta: "Por que é então que Deus permite a existência
da pobreza aqui embaixo, a não ser porque ele deseja dar-nos ocasião para
praticarmos o bem?"18
Em muitas oportunidades, Calvino
condenou severamente a ganância e a insensibilidade dos ricos, porque ele
estava preocupado com que as dádivas de Deus fossem usadas para o benefício de
toda a comunidade do povo de Deus. Graham argumenta que não foi ao ascetismo
que Calvino conclamou os ricos de Genebra, mas à regra do amor: "De fato,
se existe um tema central no pensamento social e econômico de Calvino, é que a
riqueza vem de Deus a fim de ser utilizada para auxiliar os nossos irmãos."19
A solidariedade da comunidade humana é tal que torna-se inexcusável alguns
terem abundância e outros passarem necessidade.20 Ronald Wallace observa:
"[Calvino] insistia que, como uma lei da vida, onde havia riqueza
abundante também deveria haver doações generosas dos ricos aos pobres."21
Um dos textos que Calvino utiliza
mais freqüentemente nos seus escritos e ensinos é o apelo de Isaías ao homem
rico de Israel: "…e não te escondas do teu semelhante" (58.7), que
ele interpreta como uma referência ao "teu pobre."22 Em outro sermão,
ele pondera: "Deus mistura os ricos e os pobres para que eles possam
encontrar-se e ter comunhão uns com os outros, de modo que os pobres recebam e
os ricos repartam."23
Os pobres são irmãos e devem ser
tratados como tais. Graham pondera: "Não existe uma beneficência fria no
plano calvinista; a beneficência deve ser praticada com compaixão."24 A
contribuição não deve ser uma expressão de legalismo, mas de espontaneidade e
liberalidade.25
Graham acentua a ética altruísta
articulada por Calvino no terreno social e econômico: "A solidariedade
humana é tal que qualquer coisa que contribua para o empobrecimento de uma
parte da sociedade é, ipso facto, maléfica."26 Quando Calvino
pregava sobre a proibição vetotestamentária de se privar um credor pobre da sua
mó superior, como garantia de uma dívida, ele falava com uma ênfase que hoje
pode ser entendida no sentido de que nenhuma sociedade jamais deve privar
qualquer pessoa da oportunidade de trabalhar para ganhar o seu sustento.27
O reformador ficava particularmente
exasperado com aqueles que praticavam o monopólio e a especulação envolvendo
alimentos.28 Assim sendo, ele defendeu alguma intervenção por parte do governo
para a proteção do bem comum, a fim que "os homens respirem, comam, bebam
e mantenham-se aquecidos."29 Como William C. Innes observou, Calvino
insistiu em
que a caridade
cristã e uma preocupação ética pelo bem da comunidade fossem os fatores
determinantes em todas as decisões econômicas. A sua influência e ensinos
doutrinários incentivaram e promoveram o interesse já existente em Genebra por
uma assistência ampla e respeitosa aos pobres.30
III. O Diaconato
Provavelmente a principal
contribuição teológica de João Calvino ao entendimento reformado do bem-estar
social é aquela encontrada nas suas idéias acerca do diaconato.31 Calvino tinha
o ofício de diácono em alta consideração: os diáconos eram oficiais públicos da
igreja responsáveis pela assistência aos pobres. Ele insistiu que os mesmos fossem
versados na fé cristã, uma vez que, no decurso do seu ministério, eles muitas
vezes teriam de oferecer conselhos e conforto espiritual. Na realidade,
"os diáconos na Genebra de Calvino devem ter sido peritos no que hoje
denominamos serviço social, bem como em assistência pastoral."32
Existem duas fontes principais
para os ensinos de Calvino acerca do diaconato. Primeiramente, as Institutas,
especialmente a partir da segunda edição (a edição definitiva foi publicada em
1559 e a sua tradução francesa no ano seguinte).33 Em segundo lugar, as Ordenanças
Eclesiásticas que ele redigiu para Genebra em 1541, sua "primeira
contribuição concreta para a reforma da assistência social."34 Uma fonte
adicional são os seus sermões sobre I Timóteo, publicados em 1561.
As Institutas estão
distribuídas em quatro livros que seguem em geral o modelo do Credo dos
Apóstolos. O primeiro livro trata do conhecimento de Deus como Criador e inclui
as doutrinas da Escritura, trindade, criação e providência; o segundo livro
discute o conhecimento de Deus como Redentor e inclui a queda, o pecado, a lei,
o Velho e o Novo Testamento e Cristo, o mediador – sua pessoa e obra. O
terceiro livro aborda a maneira pela qual se recebe a graça de Cristo, seus
benefícios e efeitos; inclui a fé e a regeneração, o arrependimento, a vida cristã,
a justificação, a predestinação e a ressurreição final. Por fim, o quarto livro
fala dos meios externos pelos quais Deus convida as pessoas à comunidade
cristã. Aqui Calvino trata da igreja, dos sacramentos e do governo civil. É
neste último livro que encontramos as idéias de Calvino sobre o diaconato.
Robert M. Kingdon pondera que
Calvino reagiu com firmeza contra o ensino católico romano tradicional de que
os diáconos deviam ser assistentes dos sacerdotes, auxiliando-os em várias
responsabilidades litúrgicas e administrativas, enquanto geralmente aguardavam
a promoção ao sacerdócio.35 Em vez disso, os diáconos deviam exercer um
ministério específico de serviço aos pobres. Calvino argumentou que Deus quis
que a igreja instituísse o ofício de diácono para cumprir com a sua obrigação
de assistir aos necessitados. Portanto, grande parte do seu pensamento sobre a
assistência social está relacionado com o seu conceito acerca do diaconato.36
Além disso, Calvino insistiu que
deveria haver dois tipos de diáconos: administradores, que recolhiam e geriam
os fundos destinados ao socorro dos pobres, e assistentes sociais, inclusive
viúvas, que utilizavam esses fundos na assistência direta aos carentes. Este
conceito de um duplo diaconato é particularmente característico de Calvino, a
versão definitiva deste ensino sendo encontrada na edição de 1559 das Institutas
(4:3:9).37 O reformador argumenta:
O cuidado dos
pobres foi confiado aos diáconos. Todavia, dois tipos são mencionados na Carta
aos Romanos: "Aquele que contribui, faça-o com simplicidade;… o que exerce
misericórdia, com alegria" [Rom 12.8; cf. Vulgata]. Como é certo que Paulo
está falando do ofício público da igreja, deve ter havido dois graus distintos.
A menos que eu esteja equivocado em meu julgamento, na primeira cláusula ele designa
os diáconos que distribuem as esmolas, mas a segunda refere-se àqueles que se
devotavam ao cuidado dos pobres e enfermos. Deste tipo eram as viúvas que Paulo
menciona a Timóteo [1 Tm 5.9-10]. As mulheres não podiam exercer qualquer outro
ofício público, senão o de se devotarem ao cuidado dos pobres. Se aceitarmos
isto (como deve ser aceito), haverá dois tipos de diáconos: um para servir a
igreja administrando as questões referentes aos pobres, e outro para cuidar dos
pobres eles mesmos. Assim, muito embora o termo diakonia em si mesmo tenha
uma implicação mais ampla, a Escritura designa especificamente como diáconos
aqueles a quem a igreja indicou para distribuirem as esmolas e cuidarem dos
pobres, e também servirem como mordomos da caixa comum dos pobres.
IV. O Duplo Diaconato: Fonte do
Conceito
A. Robert M. Kingdon
Kingdon indaga onde originou-se
esta doutrina clara e distintiva de um duplo diaconato. Ele propõe uma
explicação institucional: Calvino encontrou um duplo diaconato já em funcionamento
quando chegou a Genebra pela primeira vez. Esse estudioso acredita que a observação
do que acontecia no "Hospital Geral" influenciou o pensamento de Calvino
neste particular.38
Como vimos anteriormente, quando
Calvino chegou a Genebra em 1536 a cidade já havia abraçado a Reforma. Com a
expulsão ou demissão dos clérigos que ministravam às necessidades religiosas,
educacionais e sociais da cidade, havia surgido um vácuo. Novas instituições
estavam sendo criadas para preencher esse vácuo.39
Uma dessas novas instituições foi
criada para socorrer os pobres e recebeu o nome de "Hospital Geral."
Este veio a substituir uma rede de sete hospitais e uma fundação pública
chamada Pyssis Omnium Animarum Purgatorii ou "Caixa para todas as
almas no purgatório." Todas essas instituições tinham sido fundadas entre
o final do século treze e meados do século quinze. Os hospitais eram abrigos
para órfãos, aleijados, idosos e outras pessoas que não podiam cuidar de si
próprias. A Caixa recolhia fundos para ajudar os hospitais e prestava serviços
complementares. Essas instituições tinham um propósito secundário – incentivar
as orações pelos mortos que supostamente estavam no "purgatório" – o
que tornou inevitável o seu colapso com o advento da Reforma Protestante.40
Para substituí-las, o governo
municipal criou o Hospital Geral em 1535. Ele estava localizado no centro da
antiga Genebra, no que fora o convento das Irmãs de Santa Clara, sendo
sustentado por recursos provenientes de diversas fontes. O que é mais
importante, no que diz respeito aos nossos propósitos, é que a administração do
hospital estava entregue a dois tipos de oficiais: uma junta de procuradores e
um hospitaleiro.41
Esse Hospital Geral, com seus
procuradores e hospitaleiro, foi criado um ano antes de Calvino chegar a
Genebra. Assim sendo, ao chegar ele encontrou as obrigações caritativas da
comunidade sendo desempenhadas por dois tipos bastante diferentes de oficiais:
um grupo de procuradores que recolhiam esmolas e administravam as questões
referentes aos pobres e um hospitaleiro e seus auxiliares que efetivamente
cuidavam dos pobres e dos enfermos.42
Esses fatos levam Kingdon a
concluir que essa instituição influenciou o pensamento de Calvino acerca do
diaconato. Ele observa que, nas suas discussões a respeito da forma adequada
para o diaconato, Calvino às vezes utilizou os termos "procuradores"
e "hospitaleiros" para designar os dois tipos de diáconos que ele
cria serem exigidos pelas Escrituras.43
Neste ponto nos voltamos para a
outra fonte das idéias de Calvino acerca do diaconato: as Ordenanças
Eclesiásticas de 1541, que ele escreveu como uma constituição para a Igreja
Reformada de Genebra, por ocasião do seu retorno definitivo para aquela cidade.
Esse código inicia a sua seção sobre "a quarta ordem do governo
eclesiástico, a saber, os diáconos," com uma declaração do conceito de um
duplo diaconato tão clara e distintiva quanto aquela das Institutas. Em seguida,
o documento passa a fornecer os títulos de "procurador" e "hospitaleiro"
para os dois tipos de diáconos e descreve com algum detalhe os deveres de cada
um.
Kingdon não se surpreende muito
em ver que as Ordenanças utilizam termos genebrinos para os dois tipos de
diáconos. Afinal, o propósito das mesmas era fornecer uma estrutura para a
igreja reformada local.44 O que o deixa surpreso é encontrar os mesmos termos
em alguns dos comentários bíblicos de Calvino. Nos seus sermões sobre 1
Timóteo, epístola que no entender de Calvino continha textos comprobatórios
essenciais para as suas noções acerca do diaconato, ele também define os dois
tipos de diáconos ordenados pela Escritura como "hospitaleiros" e
"procuradores" dos pobres.
B. Elsie McKee
Elsie McKee prefere uma
explicação teológica para a origem das idéias peculiares de Calvino a respeito
do diaconato.45 Ela vê Calvino argumentando que a obrigação de praticar a
caridade é a segunda parte do serviço que os regenerados devem a Deus, a
primeira parte sendo as obras de devoção prescritas pela primeira tábua da
lei.46 A relação entre as duas tábuas da lei, o culto devido a Deus (pietas)
e o amor devido ao próximo (caritas), esclarece a relação que existe
entre a benevolência e a adoração. "A primeira tábua sempre tem
precedência sobre a segunda, o culto sobre a benevolência. Todavia, a evidência
mais clara da fé é o amor, não a liturgia."47
Uma vez que o pastor pode ser
visto como o ministro do culto da igreja, o líder dos officia pietatis que
expressam o primeiro mandamento do amor a Deus, assim o diácono é o ministro da
benevolência, o principal líder dos officia caritatis que atuam por
causa do amor ao semelhante.
Como as obras de caridade são
dirigidas por oficiais que possuem o título de diáconos e a natureza desse
ofício é descrita no Novo Testamento, McKee volta-se para a minuciosa história
exegética de alguns dos textos-prova de Calvino. Os mais importantes deles para
a sua interpretação geral do diaconato são Atos 6.1-6 e 1 Timóteo 3.8-13, e o
mais relevante para a sua teoria específica de um duplo diaconato é Romanos
12.8.
Atos 6.1-6 é a perícope
tradicionalmente vista como a principal fonte de informações sobre a
instituição original do ofício diaconal. Calvino argumentou fortemente que essa
passagem coloca sobre a igreja não somente uma obrigação institucional de
assistir os pobres, mas também o requisito de que esta obrigação seja cumprida
através da criação de uma ordem eclesiástica – os diáconos. O diaconato
reformado é um ofício eclesiástico leigo encarregado da benevolência como uma
função necessária da igreja. "Esse ofício permanente é o representante da
Igreja como Igreja na responsabilidade cristã comum em relação aos pobres e
afligidos."48
Além disso, existem algumas
passagens do Novo Testamento que efetivamente utilizam a palavra
"diácono" e arrolam as qualificações a ser esperadas da pessoa que
ocupa tal ofício. A mais extensa dessas passagens é 1 Timóteo 3.8-13. Calvino
relaciona esta perícope com Atos 6.1-6 (como a maioria dos intérpretes
protestantes) e insiste que o diaconato é um ofício eclesiástico de instituição
apostólica, que a sua função é servir aos pobres e não ao bispo, e que se trata
de um ofício tanto permanente quanto necessário para a verdadeira igreja.
Calvino também dá atenção especial às referências paulinas que relacionam as
mulheres, especialmente as viúvas, com a diaconia (Rm 16.1-2; l Tm 5.3-10). Ele
usa de maneira especialmente cuidadosa a descrição das viúvas em l Timóteo 5 e,
em particular, a sugestão de que a igreja deve utilizar somente viúvas idosas
com mais de sessenta anos (vv. 9-10).
O conceito de Calvino acerca de
um duplo diaconato repousa sobre a sua interpretação de Romanos 12.8. Ele
acredita que esta passagem (vv. 6-8) descreve os diferentes ofícios que Deus
quis ver instituídos na igreja, e que os trechos que descrevem o diaconato são
a segunda e a quarta cláusulas do v. 8 – aquele que contribui com liberalidade
(Vulgata: "simplicidade") é um diácono do tipo "procurador"
e aquele que exerce misericórdia com alegria é um diácono do tipo
"hospitaleiro."
McKee conclui que a doutrina de
Calvino sobre o diaconato, como quase todas as suas doutrinas, procede
diretamente da sua leitura esclarecida das Escrituras. Ao mesmo tempo, ela
admite que considerações práticas evidentemente também influenciaram a
eclesiologia do reformador. "Na tradição reformada, a pluralidade de dons
e necessidades dentro da igreja ocasionou a formulação da teoria de um único
ministério em diferentes modalidades."49 De acordo com os princípios
reformados, existem dois tipos de diáconos porque as Escrituras e a experiência
indicam que existem duas tarefas primordiais: a administração, e o cuidado
pessoal dos necessitados.50
Kingdon reconhece a força dos
argumentos de McKee mas não fica plenamente convencido.51 Ele argumenta que
houve uma evolução significativa no conceito de Calvino sobre o diaconato entre
1536 e 1539 (a primeira e a segunda edições das Institutas) e especificamente
que Calvino formulou naqueles anos o seu conceito de um duplo diaconato. O que
aconteceu entre 1536 e 1539 para dar-lhe um novo conceito sobre o diaconato? A
resposta de Kingdon é a mesma de antes – ele acredita que por dois anos Calvino
testemunhou o funcionamento bem-sucedido de um duplo diaconato na cidade de
Genebra. Ele então foi às Escrituras em busca de um apoio para essa
instituição, encontrando-o em Romanos 12.8.
Kingdon admite a possibilidade de
outras explicações.52 Calvino pode ter derivado as suas idéias de outros
autores protestantes como Lefèvre d’Etaples, Ecolampádio e Martin Bucer, ou de
outros modelos institucionais que ele pode ter conhecido em Basiléia e
Estrasburgo. Todavia, o fato permanece de que obviamente para Calvino os
argumentos mais persuasivos acerca do diaconato eram aqueles baseados em apelos
explícitos e precisos às Escrituras.
C. William Innes
William Innes tem uma
contribuição interessante nesta questão. Ele declara: "Existem evidências
indicando que as idéias próprias [de Calvino] sobre assistência social foram profundamente
influenciadas pelo que ele viu implementado em Genebra."53 Ao mesmo tempo,
ele chama a atenção para o fato de que os anos passados em Estrasburgo
exerceram uma influência duradoura em muitos aspectos da teologia de Calvino:
"A influência de Bucer sobre o pensamento de Calvino não pode ser exagerada."54
Calvino não somente professava uma profunda admiração por Bucer, mas concordou
com esse reformador em todas as questões teológicas importantes.
Conforme expressa nos seus
escritos, a evolução do pensamento de Calvino sobre o diaconato faz Innes
chegar a duas conclusões:55 antes de tudo, a dupla função para os diáconos
defendida por Calvino não resultou da sua experiência em Genebra, mas da
concepção de ministério do seu mentor Martin Bucer, conforme exposto no manual
de assistência pastoral Von der wahren Seelsorge. Assim sendo, tanto no
seu comentário sobre Romanos 12.8 (1540) como na edição de 1541 das Institutas
(4:3:9), Calvino inequivocamente defende dois ofícios distintos na
assistência aos pobres: o primeiro para suprir as suas necessidades materiais e
o segundo para visitá-los e ministrar a eles.
Em segundo lugar, após o seu
retorno a Genebra, Calvino tornou-se mais flexível e prático. Ele mostrou-se
disposto a mudar de opinião quanto à natureza exata do diaconato, uma questão
relativamente menor, a fim de evitar dificuldades desnecessárias. Conseqüentemente,
nas Ordenanças Eclesiásticas de 1541 e nos seus sermões, Calvino adaptou o
diaconato de Genebra à situação existente no Hospital Geral. Os sermões sobre 1
Timóteo, pregados no outono e inverno de 1554-1555, definem os diáconos
exclusivamente como os dois tipos de oficiais do hospital de Genebra. Calvino
fala textualmente nos "…diáconos, ou seja, os ‘hospitaleiros’ e os
‘procuradores’ dos pobres…"56
Dessa maneira, McKee observa que
"é correto e natural indagar como a reforma do bem-estar social no século
dezesseis (o contexto histórico), bem como a doutrina da igreja (o contexto
teológico), contribuíram para moldar o ensino reformado sobre o
diaconato."57
V. A Assistência Social na
Genebra de Calvino
A. O Hospital Geral
Como Kingdon pondera
acertadamente, o fato de o Hospital Geral já existir quando Calvino chegou a
Genebra não significa que ele não fez nenhuma contribuição à reforma da assistência
social naquela cidade.58 Ao contrário, a contribuição de Calvino foi de vital importância
para o êxito do programa assistencial porque ele sacramentou essa reforma e persuadiu
os genebrinos de que as suas novas instituções eram criações santas que estavam
em conformidade com a Palavra de Deus.59 Assim, a sua contribuição não foi a de
um criador, mas a de um consolidador, dando àquelas instituições vitalidade e
estabilidade.
Como vimos anteriormente, a
primeira contribuição tangível de Calvino à reforma da assistência social foram
as Ordenanças Eclesiásticas que ele redigiu para Genebra em 1541. Ele obteve o
direito de redigir esse conjunto de leis – com efeito uma constituição para a
Igreja Reformada de Genebra – como parte da negociação que o trouxe de volta à
cidade. Nas Ordenanças Calvino combinou os seus interesses religiosos com os
seus talentos jurídicos.
As Ordenanças dividiram o governo
da igreja entre quatro ofícios ministeriais: os pastores, que proclamam a
Palavra de Deus; os doutores ou mestres, que estudam e ensinam as Escrituras;
os presbíteros, que mantêm a disciplina cristã; e os diáconos, que cuidam dos
pobres. O conjunto dos pastores e doutores constituía a Companhia dos Pastores
de Genebra, também conhecida como a Venerável Companhia. Os presbíteros e os pastores
formavam o Consistório, um tipo de tribunal eclesiástico, a instituição mais
controvertida da reforma em Genebra.60
Quanto aos diáconos, as
Ordenanças declaram que "sempre houve dois tipos de diáconos na igreja
primitiva. Alguns foram comissionados para receber, distribuir e preservar a
propriedade dos pobres: as esmolas diárias bem como haveres, rendas e pensões.
Outros deviam cuidar dos enfermos, pensar as suas feridas, e dispensar as
rações alimentares dos pobres." Os primeiros correspondiam aos
procuradores do hospital; os outros, ao hospitaleiro.
A junta de procuradores do
hospital era uma das comissões que governavam a cidade. Os seus membros eram
eleitos a cada ano a partir de uma lista preparada pelo Pequeno Conselho, o
órgão dirigente do governo republicano que agora controlava Genebra. Um procurador
do hospital podia ser reeleito para vários mandatos. Geralmente ele era um comerciante
próspero ou um profissional. Mais tarde tornou-se habitual que o Conselho
pedisse sugestões ao pastor da cidade ao elaborar a lista anual de procuradores.
Estes reuniam-se uma vez por semana, geralmente bem cedo aos domingos, para
analisar o funcionamento do Hospital Geral e tomar decisões quanto a subsídios
de assistência a famílias carentes específicas.
O hospitaleiro era responsável
pela administração diária do Hospital Geral.61 Ele morava no próprio hospital
com a sua esposa e supervisionava o programa de assistência aos muitos
necessitados que ali também residiam, a maioria órfãos e menores abandonados, e
alguns deficientes físicos ou decrépitos. O hospitaleiro organizava equipes de
cozinheiros que faziam pão e vinho para os internos. Ele era auxiliado por um
professor para as crianças, um barbeiro-cirurgião e um farmacêutico que
ofereciam assistência médica, e serventes encarregados de tarefas mais simples.
A equipe devia produzir uma boa quantidade extra de pão que era distribuído uma
vez por semana a famílias pobres que necessitavam de auxílio temporário. Em sua
reunião semanal os procuradores preparavam uma lista dessas famílias.
Geralmente o hospitaleiro era um comerciante, muitas vezes um mercador idoso
que desejava uma ocupação mais sedentária.
Em Genebra, os procuradores e o
hospitaleiro do Hospital Geral, que correspondiam aos dois tipos de diáconos,
ficavam sob a supervisão dos pastores e presbíteros, representando a igreja, e
de um dos quatro síndicos (os magistrados governantes), representando o governo
secular. Vários desses oficiais supervisores deviam visitar e inspecionar o
Hospital Geral a cada três meses.
As Ordenanças Eclesiásticas
também deram aos pastores um papel importante na escolha dos diáconos. O
governo da cidade considerava tanto a junta de procuradores do hospital quanto
o consistório de presbíteros como comissões permanentes da municipalidade, sujeitas
a eleição anual, aquela estando encarregada de assistir os pobres e este de
manter a moralidade.
As Ordenanças de Calvino
determinavam que o Pequeno Conselho devia consultar os pastores ao elaborar as
suas listas anuais de presbíteros e diáconos. Elas também sugeriam que os
mandatos desses cargos fossem prorrogados muitas vezes, contanto que os
oficiais estivessem fazendo um bom trabalho. Essa era uma fonte de estabilidade
e continuidade para o trabalho de ambas as instituições. Finalmente, as
Ordenanças sugeriam os tipos de homens que deviam ser considerados para esses
cargos de acordo com o modelo encontrado em 1 Timóteo 3 e Tito 1.
Parece que por muito anos o
governo da cidade deixou de consultar os pastores na seleção dos diáconos.62 A
consulta tornou-se efetiva somente em 1562, quando a Companhia dos Pastores
queixou-se de que as Ordenanças não estavam sendo observadas nesse particular.
Todavia, existem evidências sugerindo que durante o ministério de Calvino a sua
influência na escolha dos diáconos foi importante, mesmo quando indireta. Com o
passar dos anos, os homens escolhidos tendiam a estar cada vez mais próximos
dele e do grupo que apoiava as suas linhas de ação.
Innes observa que os procuradores
eram partidários devotados de Calvino.63 Por esta e outras razões, ele
raramente precisava intervir no funcionamento e administração do sistema do
hospital, particularmente nos anos posteriores da sua vida. No início da década
de 1560 surgiu uma espécie de ministério leigo dedicado constituído por homens
que participavam tanto do Consistório quanto da junta do hospital, e eram leais
aos pastores.
B. O Fundo Francês
O Hospital Geral foi concebido
tão somente para aliviar a pobreza entre os genebrinos. As leis locais pouco ou
nada diziam a respeito dos estrangeiros. Essa situação poderia tornar-se uma
fonte de sérias dificuldades por causa do enorme influxo de refugiados
religiosos na cidade. Muitos protestantes de outros países, principalmente da
França, mas também da Itália, Inglaterra e Espanha, estavam indo para Genebra,
forçados pela perseguição religiosa e atraídos pela pregação de Calvino e pela
comunidade modelo que ele estava criando.64
Calcula-se que entre 1541 e 1560
a população da cidade duplicou, e que a maior parte desse aumento resultou da
imigração. Esse influxo intenso de refugiados em Genebra acarretou sérios
problemas sociais. Os recém-chegados estavam competindo com os moradores locais
por espaço, alimento e trabalho. As condições sanitárias eram precárias e as
doenças contagiosas, endêmicas. Muitos dos refugiados eram relativamente
prósperos, mas alguns precisavam de assistência.
A fim de fazer face a esses
problemas causados pela imigração, foi criada uma nova instituição, a Bourse
des pauvres étrangers français (Fundo para os estrangeiros franceses pobres),
mais conhecida como Bourse française (Fundo francês).
Jeaninne Olson, uma professora de
história no Rhode Island College, escreveu uma importante obra sobre este
tópico, com base em extensas pesquisas nos arquivos de Genebra.65 Ela argumenta
que o Fundo Francês foi uma inovação entre as instituições assistenciais da
Europa, que dedicavam-se primariamente ao atendimento de necessidades locais.66
O Fundo Francês pode já ter sido
criado em 1545. Naquele ano, David Busanton, um rico refugiado, deixou para as
cidades de Estrasburgo e Genebra dois consideráveis legados para o auxílio de
refugiados religiosos. Calvino comunicou alegremente o recebimento do legado ao
seu amigo Viret. Alguns estudiosos acreditam que foi isto que deu origem ao
Fundo Francês, mas nenhuma cópia do testamento de Busanton chegou até nós. Em
1550 o Fundo obviamente já estava em funcionamento, pois os seus livros
contábeis daquele ano foram preservados. Os diáconos que então administravam o
Fundo tinham se fixado em Genebra em 1549. Assim sendo, parece que o Fundo foi
inicialmente criado logo após 1545 e tornou-se plenamente organizado em 1549,
justamente quando começou o intenso fluxo migratório religioso da França para
Genebra.67
Na época em que têm início os
registros sobreviventes do Fundo, este era dirigido por três refugiados
franceses que eram denominados os seus diáconos. Todos os três eram homens de
posses consideráveis. O mais conhecido e atuante deles era Jean Budé, o chefe
de uma família muito ilustre (o seu pai Guillaume Budé foi um dos grandes
intelectuais do século dezesseis). Budé tornou-se o primeiro diácono conhecido
do Fundo Francês, manteve os seus livros de registros por doze anos e continuou
a servir o Fundo de outras maneiras até a sua morte em 1587.
Essencialmente, o que o Fundo
fazia era angariar dinheiro de refugiados ricos e utilizá-lo para dar
assistência a refugiados pobres. Os diáconos mantinham listas desses contribuintes,
que incluíam figuras destacadas, entre elas o mais famoso refugiado de todos, o
próprio João Calvino. Calvino fazia regularmente generosas contribuições ao
Fundo Francês e também recomendava pessoas a serem assistidas. Eventualmente os
diáconos recrutaram coletores para ajudá-los a arrecadar esses fundos e mais
tarde também auditores para examinarem as contas.
Os diáconos do Fundo gastavam os
recursos com uma impressionante variedade de projetos caritativos. Eles
ajudavam os novos refugiados a obterem moradia em casas particulares,
hospedarias ou pensões. Eles forneciam camas ou colchões, pequenas doações em
dinheiro ou cereais para os carentes, conjuntos de ferramentas, ou matrículas
para os aprendizes de ofícios. Os diáconos contratavam amas de leite ou mães
adotivas para os bebês cujas mães refugiadas haviam morrido. Eles também
ofereciam serviços médicos através de um médico, um barbeiro-cirurgião e um
farmacêutico. Os diáconos compravam tecidos e contratavam alfaiates e
costureiras para fazerem roupas para os pobres.68
Os diáconos do Fundo Francês
também aplicavam recursos em muitos outros projetos ministeriais. Eles
contrataram copistas em tempo integral para copiarem os sermões e palestras de
Calvino. Eles custearam a distribuição na França de um saltério ou hinário
recentemente traduzido e de outros livros religiosos. O Fundo envolveu-se até
mesmo com a obra missionária ao sustentar pastores que estavam em Genebra
aguardando sua nomeação para igrejas na França, bem como as viúvas e filhos
órfãos de pastores que haviam morrido no exercício de suas funções.69
Todas essas atividades eram até
certo ponto supervisionadas e incentivadas pelos pastores. Calvino bem pode ter
participado da criação do Fundo Francês. Ele certamente era um amigo próximo
dos seus primeiros diáconos; há registros de que eles ocasionalmente reuniam-se
em sua casa. Ele deu-lhes dinheiro do seu salário regularmente, e não hesitou
em recomendar a esses diáconos indivíduos ou projetos específicos que julgava
merecedores de assistência.
Olson observa que "o Fundo
Francês contém exemplos concretos do pensamento de Calvino posto em ação,
revelando que ele não somente pregava a caridade mas também auxiliava
generosamente os pobres."70 O Fundo Francês em essência honrou as idéias
germinais do reformador acerca da caridade e do papel dos diáconos. A visão de
Calvino a respeito dos deveres dos cristãos para com os necessitados e do papel
dos diáconos na igreja forneceu o arcabouço conceptual dentro do qual surgiu o
Fundo Francês.71
Olson também observa que o Fundo
adaptava-se muito mais de perto que o hospital de Genebra ao ideal de uma
organização dirigida por oficiais da igreja.72 A seção acerca dos diáconos nas
Ordenanças Eclesiásticas, formulada com base no modelo do Hospital Geral, não
combina com os diáconos do Fundo Francês, onde não havia nenhuma divisão no ofício
diaconal. "O Fundo combinava tanto o trabalho administrativo (como o dos
procuradores do hospital) quanto os contatos pessoais (como o do hospitaleiro)
no único ofício de diácono."73
Dessa maneira, McKee argumenta
que a cidade-estado de Genebra oferece exemplos do diaconato reformado tanto na
sua forma "oficial" quanto na forma "não oficial."74 Ela sustenta
que, na sua diversidade, os modelos oficial e não oficial ilustram um elemento
de adiaphora ("coisas indiferentes") no ofício de diácono. "Do ponto
de vista teológico, no entanto, ambos os diaconatos eram considerados ofícios
eclesiásticos, e juntos permanecem como um claro testemunho da preocupação de
Calvino com a atuação da Igreja como Igreja na esfera social."75
No Hospital Geral, a influência
de Calvino era indireta, porém evidente. No caso das organizações voluntárias
de refugiados como o Fundo Francês, que estavam ligadas muito mais de perto à
igreja, a sua participação foi vigorosa e acentuada. Esta diferença nas
atividades beneficentes do reformador não envolve necessariamente maior
aprovação a uma das instituições do que à outra. Ela apenas sugere um certo
grau de realismo (bem como de sentimento patriótico): uma das organizações
tinha maior necessidade prática de auxílio.
Conclusão
As instituições beneficentes
criadas pela Reforma em Genebra subsistiram por vários séculos e serviram para
ilustrar dois princípios essenciais acerca da administração da caridade cristã:
o papel essencial dos leigos e a necessidade de flexibilidade e inovação.
O sistema de beneficência de
Genebra foi notável porque, entre outras razões, respondeu à ênfase teológica
de Calvino sobre a caridade como uma expressão necessária do amor a Deus e ao
próximo. O diaconato (bem como a entrega de ofertas para fins caritativos no
culto formal) era uma expressão dessa preocupação fundamental. Dentro desse
contexto, a Igreja Reformada achou necessário cuidar dos necessitados de uma
maneira organizada, principalmente através de instituições como o Hospital
Geral e o Fundo Francês.
Existe uma coerência fundamental
entre as idéias de João Calvino a respeito de dinheiro, pobreza e ética cristã,
por um lado, e as práticas beneficentes da Igreja Reformada de Genebra, por
outro lado. Calvino não somente escreveu e pregou amplamente sobre o assunto,
mas, juntamente com os outros pastores locais, pressionou repetidamente as autoridades
locais para que protegessem os pobres e adotassem leis que favorecessem a
beneficência.
A maior parte das noções de
Calvino acerca do diaconato e da beneficência não eram inteiramente novas. Ele
foi obviamente influenciado por outros reformadores e por situações concretas
que testemunhou ao seu redor. Essencialmente, Calvino e os demais reformadores
criam que o cristão é um mordomo das dádivas de Deus e que a boa mordomia leva
o crente a ter um espírito aberto e generoso para com os menos afortunados.
Em conclusão, é estimulante ver o
lugar de destaque dado por Calvino às preocupações sociais tanto na sua
teologia de maneira geral como nas suas práticas ministeriais na cidade de
Genebra. Este é um precioso legado que necessita ser redescoberto e resgatado
por seus herdeiros contemporâneos, numa época em que muitas igrejas evangélicas
e reformadas têm se esquecido das suas responsabilidades nessa área.
Ainda que à igreja de Cristo não
caiba primordialmente a tarefa de resolver os graves problemas sociais do nosso
país, o testemunho insistente das Escrituras e o exemplo eloqüente dos que nos
precederam na fé não nos permitem ficar inativos nessa área, se realmente nos
consideramos seguidores daquele que "andou por toda parte, fazendo o
bem" (Atos 10.38).
__________________________
Notas
1
Carter Lindberg, "Diaconia," Tower Notes (Boston University
School of Theology), no. 3 (outono de 1991): 2. "Diaconia," do grego diakonia (serviço,
ministração), refere-se ao serviço cristão, especialmente em sua dimensão
social e beneficente, como responsabilidade comum de todos os cristãos. Já o
termo "diaconato" designa essa mesma função enquanto exercida por
oficiais da igreja, os diáconos.
2 Ibid.,
3.
3 Ibid.
4 Esta seção
baseia-se essencialmente na obra de Timothy George, Theology of the Reformers
(Nashville: Broadman, 1988).
5 Suzanne
Selinger, citada por George, Theology of the Reformers, 168.
6 Ibid.
7 Ibid., 171.
8 Howard Clark Kee, Emily Albu Hanawalt,
Carter Lindberg, Jean-Loup Seban e Mark A. Noll, Christianity: A Social and
Cultural History (New York: Macmillan, 1991), 373.
9 Erasmo de Roterdã também estava residindo em
Basiléia, onde veio a falecer dois anos mais tarde, em 1536.
10 George, Theology of the Reformers, 177.
11 George pondera que, em virtude de sua
"natureza tímida e retraída, ele desejava viver em erudito isolamento."
Ibid., 175.
12 Ibid., 180.
13 Ibid., 181-184.
14 Ibid., 182.
15 Kee e outros, Christianity: A Social and
Cultural History, 378.
16 A edição
mais completa das obras de Calvino é intitulada Ioannis Calvini Opera Quae
Supersunt Omnia (abreviada como C.O. ou Calvini Opera), que
foi publicada nas línguas originais – latim e francês – em 59 alentados
volumes, entre 1863 e 1900. Na realidade, trata-se dos volumes 29-87 de uma
produção ainda mais ambiciosa, o Corpus Reformatorum, que inclui obras
de outros reformadores. Nas citações, o primeiro número indica o volume (das
obras de Calvino, não do Corpus Reformatorum) e o segundo número indica
a coluna (cada página tem 2 colunas numeradas separadamente).
17 W. Fred Graham, The Constructive Revolutionary: John Calvin and
His Socio-Economic Impact (Richmond, Virginia: John Knox, 1971), 66. Ver C.O. 31:418 – Comentário
sobre Salmo 41.1.
18
"Pourquoy donc est-ce que Dieu permet que il y ait des povres ici bas,
sinon d’autant qu’il nous veut donner occasion de bien faire?" C.O. 27:337
– Sermão 95 sobre Deuteronômio 15.11-15 (30 de outubro de 1555).
19 Graham, Constructive Revolutionary, 68.
20 Ver C.O. 50:101-102 – Comentário sobre 2
Coríntios 8.15.
21 Ronald S. Wallace, Calvin, Geneva and the Reformation: A Study of
Calvin as Social Reformer, Churchman, Pastor and Theologian (Grand Rapids:
Baker, 1990), 90.
22 Ver C.O. 27:326 – Sermão 94 sobre
Deuteronômio 15.7-10 (26 de outubro de 1555).
23 C.O.
27:342 – Sermão 95 sobre Deuteronômio 15.11-15.
24 Graham, Constructive Revolutionary, 69. Ver C.O. 55:340-34l –
Comentário sobre 1 João 3.17.
25 Ver C.O.
50:98 – Comentário sobre 2 Coríntios 8.8.
26 Graham, Constructive Revolutionary, 70.
27 Wallace, Calvin, Geneva and the
Reformation, 123. Ver C.O. 28:149-163 – Sermão 136 sobre Deuteronômio 24.1-6.
28 Ver C.O.
43:145s – Comentário sobre Amós 8.6.
29 Institutas
4:20:3 (os números referem-se respectivamente ao livro, capítulo e seção, neste
caso "O Governo Civil").
30 William C. Innes, Social Concern in Calvin’s Geneva, Pittsburgh
Theological Monographs, New Series, 7 (Allison Park, Pennsylvania:
Pickwick, 1983), 247-248.
31 Robert M. Kingdon, "Calvin’s Ideas
about the Diaconate: Social or Theological in Origin?" In Piety, Politics,
and Ethics, ed. Carter Lindberg (Kirksville, Missouri: Sixteenth Century
Journal Publishers, 1984), 168.
32 George, Theology of the Reformers,
240.
33 Calvino
publicou pela primeira vez a sua principal obra em 1536, e continuou a
ampliá-la, revisá-la e reorganizá-la no restante da sua vida. Ao todo ele
produziu oito edições do texto latino e cinco traduções para o francês. Foi
somente na edição definitiva de 1559 que ele ficou satisfeito com a estrutura
da obra. As Institutas de 1559 são uma obra volumosa, maior em tamanho que todo
o Velho Testamento.
34 Robert M. Kingdon, "Calvinism and Social Welfare," Calvin
Theological Journal 17, no. 2 (Novembro 1982), 220.
35 Kingdon, "Calvin’s Ideas," 168. Ver Institutas
4:15:5.
36 Ibid.
37 O Capítulo
3 do Livro IV das Institutas trata dos doutores e ministros da igreja, sua
eleição e ofício.
38 Kingdon, "Calvin’s Ideas," 168-171.
39 Ver Innes, Social Concern in Calvin’s
Geneva, 91-99.
40 Kingdon, "Calvin’s Ideas," 169.
41 Ver Innes, Social Concern in Calvin’s
Geneva, 121-126.
42 Kingdon, "Calvin’s Ideas," 171.
43 Ibid.
44 Ibid.
45 Elsie Anne McKee, John Calvin: On the
Diaconate and Liturgical Almsgiving (Genebra: Librairie Droz, 1984), 137,
223. A autora
argumenta que "o contexto teológico do diaconato de Calvino é encontrado
na sua doutrina da Igreja" (p. 130). McKee, uma especialista em Calvino, é
professora de história do culto no Seminário Teológico de Princeton.
46 Ibid., 227-263; ver também Elsie A. McKee, Diakonia in the
Classical Reformed Tradition and Today (Grand Rapids: Eerdmans, 1989),
29-31.
47 McKee, John Calvin, 267.
48 Ibid.,
223.
49 Ibid., 133. Ver McKee, Diakonia,
39-44.
50 Ibid., 223. Em seu outro livro a
respeito do tema, McKee argumenta que "a organização do ensino de Calvino
sobre o diaconato, bem como o seu desenvolvimento, pode ser observada em dois
estágios principais centrados nos dois tipos de diáconos" (Diakonia,
66). Primeiramente, houve o desenvolvimento dos diáconos administrativos com
base em Atos 6.1-6 e l Tm 3.8-13. A seguir, houve o desenvolvimento das
diaconisas, conforme apoiado por Rm 16.1-2 e l Tm 5.3-10. Finalmente, a
coordenação do duplo diaconato foi encontrada em Romanos 12.8.
51 Kingdon, "Calvin’s Ideas," 174.
52 Ibid., 178-179.
53 Innes, Social Concern in Calvin’s Geneva,
103.
54 Ibid., 107. Estrasburgo já possuía um
sistema assistencial desenvolvido, que fora influenciado pelo de Nuremberg.
Calvino pode ter sido influenciado tanto pela praxis de Estrasburgo
quanto pela teoria de Bucer.
55 Ibid., 111-115.
56 "… les diacres, c’est à dire les hospitaliers
et les procureurs des povres." C.O. 53:291.
57 McKee, Diakonia, 59.
58 Kingdon, "Calvinism and Social
Welfare," 220.
59 Ibid.
60 Kee e outros, Christianity: A Social and
Cultural History, 379.
61 Ver Innes, Social Concern in Calvin’s
Geneva, 129-154.
62 Kingdon, "Calvinism and Social
Welfare," 221.
63 Innes, Social Concern in Calvin’s Geneva,
154.
64 Ver ibid., 205-216.
65 Jeaninne E. Olson, Calvin and Social
Welfare: Deacons and the Bourse Française (Selinsgrove, Pennsylvania: Susquehanna
University Press, 1989). Outra obra relativamente recente de Olson sobre o
diaconato é One Ministry, Many Roles: Deacons and Deaconesses Through the
Centuries (St. Louis, Missouri: Concordia, 1992).
66 Ibid., 24.
67 Kingdon, "Calvinism and Social
Welfare," 225.
68 Ibid., 227.
69 Ibid.
70 Olson, Calvin and Social Welfare,
27.
71 Ibid., 29.
72 Ibid., 32.
73 Ibid., 92.
74 McKee, John Calvin, 113. A autora usa os termos
técnicos "established" e "disestablished." Ver também
McKee, Diakonia, 56-57.
75 McKee, John Calvin, 113.
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